EDITORIAL

Caros/as leitores, 

É com satisfação que apresentamos mais uma edição do suplemento da linha Cadernos IRELGOV. Este novo espaço nos permite focar em temas específicos e em importantes debates que acontecem no Instituto. 

Esta edição aborda os encontros realizados pelo GT Relações com Governos Subnacionais, sob liderança de Raquel Rocha.

Cada matéria explora o que foi discutido nos encontros, permitindo que todos aqueles interessados no tema possam conhecer os assuntos debatidos.

Boa leitura!

Gisela Martinez e Thomaz D’Addio

NESTA EDIÇÃO

ABERTURA

Grupo de Trabalho - Estratégias nas relações com governos subnacionais

Uma das preocupações do IRELGOV é elevar a capacitação do profissional de Relações Institucionais e Governamentais. Na busca por desenvolver boas práticas e aperfeiçoamento em áreas específicas, o think tank incluiu a temática de governos subnacionais na iniciativa dos Grupos de Trabalho. 
   
O objetivo do GT é reunir profissionais da área para debater temas e subtemas da Agenda de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Instituto. Os encontros do GT aconteceram em formato virtual de agosto a dezembro de 2023. Os encontros visaram construir um espaço de escuta plural, com profissionais convidados de diversos setores para debater experiências. Foram cinco encontros focados nos subtemas e um encontro adicional para debatermos boas práticas de uma forma mais específica, mesmo que elas tenham sido apresentadas e discutidas ao longo dos encontros. Cada conversa realizada será apresentada nesta edição e aproveito o ensejo, inclusive, para agradecer mais uma vez a disponibilidade dos profissionais citados. A atuação dos profissionais de Relações Governamentais e Institucionais com governos subnacionais ainda é incipiente no Brasil e esta foi uma primeira iniciativa, altamente relevante, de escuta dos profissionais para compreendermos melhor a dinâmica do cenário profissional local. 

Ficou evidente que mesmo que alguns atores privados tenham uma atuação prevista para governos subnacionais, ela é secundária à federal, foca em gestão de crise e/ou somente na agenda tributária e carece de planejamento e estratégicas específicas. O cenário é resultado de equipes enxutas, que precisam focar e eleger prioridades em pouco tempo, pelo fato da profissionalização da atividade como um todo ser recente e de ter tido um início mais robusto na esfera federal. 

Contamos com a participação de Luiz Eduardo Daruiz Corrêa, Gerente Institucional São Paulo e Sul da Vivo, que focou no caso da Lei das Antenas na cidade de São Paulo para debater o subtema da Construção de Agenda Local e Mecanismos de Influência. Corrêa detalhou os desafios da atuação em um setor altamente regulado, com serviço presente fisicamente na estrutura das cidades, e a dificuldade em cobrir um número extenso de municípios com equipe enxuta.   

Na sequência, pudemos aprender um pouco sobre a atuação da Suzano no Estado de São Paulo, com inovações de gestão de risco aplicados à RIG e descrevendo o dia a dia do contato e construção de relacionamento com representantes de municípios pequenos, debatendo o subtema de Gestão de Stakeholders com Guilherme Vieira, Consultor Relações Corporativas da Suzano. 

Bárbara Teles, Relações Governamentais e Regulatório do Rei do Pitaco, trouxe a questão da regulamentação do código ISS para a atividade de fantasy games na cidade de São Paulo salientando a necessidade de construção de relações sólidas, atuação contínua, persistente e alinhada com o debate da esfera federal para o subtema do Relacionamento e Lobby entre Entes Federados. 

Para tratar do subtema de Estratégias de Monitoramento de Agendas e Questões Locais, Rebecca Bonaldi, Gerente de Public Affairs da Prospectiva, compartilhou um pouco do seu dia a dia na consultoria e confirmando que os clientes acabam por esperar proposições da consultoria para a agenda local.
 
Para fechar, tivemos Luigi Tedeschi, Coordenador de Relações Governamentais da Toyota, que trouxe exemplos variados de ações sociais realizadas por empresas para tratarmos da participação social na formulação de políticas públicas e incitou diversas reflexões sobre oportunidades de ganho possíveis. 

O que atravessou todas as conversas é que ainda atuamos demasiadamente em formato de gestão de crise, ou no máximo reativo, quando se trata de governos subnacionais, sendo pouco propositivo e com pouquíssimo planejamento focado nas especificidades e oportunidades que cada estado e município apresenta. Além do quanto a esfera local demanda presença constante - adaptações e sutilezas ao que é realizado no âmbito federal – seja no desenho dos pleitos ou nas estratégias, uma vez que o local é mais claramente influenciado pelas teias partidárias, demanda mais informalidade nas interações e cada região do Brasil detém um processo muito particular de interação e percepção dos issues, além do grande obstáculo da disponibilidade e acesso a informações confiáveis. 
 
Apesar disso, com a pandemia do Covid-19, ficou ainda mais evidente o quanto os governos subnacionais são essenciais para a manutenção da democracia e implementação de políticas públicas. Seja no estabelecimento de medidas simples de proteção do cidadão como a obrigatoriedade do uso da máscara, busca e compra de vacinas ou em planos de recuperação econômica adequados às demandas locais e acreditamos que a atuação subnacional dos profissionais de RIG deve ter uma crescente, seja por necessidade ou visão estratégica.

Conheça a coordenadora:

Raquel Rocha é doutora em Relações Internacionais pela USP e gerente de Relações Institucionais da São Paulo Negócios, da Prefeitura de São Paulo.

Convidado: Luís da Cruz Correia

MATÉRIA

Prioridade para o debate local

No dia 15 de agosto de 2023, foi realizada reunião on-line do GT Relações com Governos Subnacionais, sob liderança de Raquel Rocha, e com a participação de Luís da Cruz Correia, gerente sênior da Vivo. O foco foi explorar as complexidades e estratégias envolvidas na interação entre empresas e governos subnacionais, com ênfase especial no setor de telecomunicações.

A diretora-executiva do IRELGOV, Lara Gurgel, fez a abertura do encontro e explicou que os GTs foram criados com o objetivo de fomentar o debate de temas relevantes e dar espaço para ouvir as opiniões dos associados. “Com foco especial nos assuntos da nossa Agenda de Temas”, disse.

Raquel Rocha falou da importância de se priorizar o debate local. “O início de muitas discussões deveria acontecer nos estados e municípios, e não no Governo Federal”, afirmou. As agendas devem ser adaptadas às especificidades de cada região e à necessidade de desenvolver mecanismos de influência que permitam uma comunicação eficaz e direta para interagir com governos subnacionais. A abordagem deve ser propositiva, antecipando possíveis desafios e estabelecendo bases sólidas para futuras negociações. Luís Correia abordou o recente caso das antenas de celulares, quando atuaram por meio da Conexos, entidade setorial, em campanhas de advocacy que defendiam o ponto de vista do setor, o que acabou se mostrando uma estratégia bem-sucedida. 

Outro ponto foram os desafios relacionados ao compliance e às regulamentações locais, com destaque para a necessidade de as empresas se manterem atualizadas com as mudanças na legislação e adaptarem suas práticas de maneira ágil. A transparência na comunicação com órgãos governamentais foi apontada como crucial para construir confiança e facilitar o diálogo. Foi realçada a importância de estratégias bem planejadas e a execução de práticas de compliance rigorosas.

Por fim, foi debatida a relevância de construir relacionamentos sustentáveis e éticos com os governos locais, buscando colaborar para superar barreiras regulatórias e legislativas. A identificação e o engajamento de stakeholders-chave, bem como a elaboração de estratégias que alinhem os interesses empresariais com as políticas públicas, foram destacados como elementos essenciais para o sucesso nesse contexto. “O primeiro passo consiste em identificar seus stakeholders, que têm alguma sensibilidade com o seu tema. É preciso descobrir quem de fato é relevante para o debate e para o sucesso do processo”, disse Luís Correia.

Convidado: Guilherme Vieira

MATÉRIA

Adaptação como base para estratégias mais eficazes

Ser capaz de adequar o discurso às realidades locais. Essa foi a síntese da reunião do GT Subnacionais realizada no dia 12 de setembro de 2023, que teve como convidado Guilherme Vieira, graduado em Relações Internacionais pela FAAP e executivo da área de Relações Governamentais da Suzano.

A reunião focou em estratégias de relações corporativas e governamentais, especialmente no âmbito dos governos subnacionais, destacando a importância da construção de uma relação público-privada eficaz. “Temos que debater essa relação. Esses nossos encontros são ótimos para isso, pois trazem à luz uma série de boas práticas de colegas e profissionais da área, que podem ser compartilhadas”, disse. 

Vieira discorreu sobre os desafios e práticas na gestão de stakeholders em diferentes municípios. A conversa focou em temas como a importância de adaptar discursos e ações às realidades locais. “É importante entender as especificidades de cada município, conhecer as dificuldades locais e mapear as autoridades”. 

Ele também ressaltou a importância de um registro meticuloso das reuniões para fins de compliance e jurídicos e a estratégia de nunca realizar reuniões sozinho. “Não apenas por uma questão de transparência, mas também de conhecimento técnico. Isso faz com que, de acordo com o teor da reunião, eu leve colegas de outras áreas. Em outros casos, vou acompanhado de representantes de uma associação setorial”.

Ele compartilhou técnicas para construir relações positivas com os municípios, mesmo diante de desafios como a percepção negativa sobre o impacto ambiental do eucalipto, insumo essencial da Suzano. “Há uma ‘lenda rural’ de que o eucalipto seca o solo, e os prefeitos muitas vezes usam esse argumento em eventuais conversas. Consequentemente, nossa agenda é mais institucional do que legislativa. Por isso me esforço ao máximo para manter os canais de comunicação abertos com as autoridades locais, inclusive com presença física. Às vezes faço viagens de quatro horas de estrada para reuniões de meia hora, porque sei que o prefeito faz questão de contar comigo nesses 30 minutos”. 

A complexidade da atuação em níveis municipal e estadual exige estratégias proativas e adaptativas. “Não temos como estar presentes em todos os municípios, então estabelecemos um ranking de prioridades. Sempre deixo claro que não poderemos atender todos os pedidos, mas que vamos ouvir cada um deles”.

Convidada: Bárbara Teles

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Propositividade, empatia e persistência

A reunião do GT Subnacionais de 17 de outubro de 2023 abordou estratégias governamentais subnacionais, destacando transparência, preparação, propositividade e persistência em relações governamentais. A convidada, Bárbara Teles, advogada de Regulatory and Public Affairs do Rei do Pitaco e diretora de Relações Governamentais da Associação Brasileira de Fantasy Sport (ABFS), contou sua experiência na área de jogos de fantasia e abordagens regulatórias e tributárias.

Teles contou que acompanha o tema de jogos desde 2015. “É um assunto relativamente novo no país. Esse entretenimento leve representa uma oportunidade para os profissionais de relações governamentais desbravarem”, disse. Ela explicou que ainda não há uma legislação específica para a atividade, o que representa alguns hiatos regulatórios. Como as empresas dependem de investimentos, muitas vezes estrangeiros, há um espaço para a atuação de relgovers. “O fantasy game não tem uma legislação específica, mas você começa a enxergar outras oportunidades ali não só de engajamento, mas de estratégia. Então você pode pensar em uma exigência regulatória para engajar com estados e municípios. Você tem ameaças e oportunidades nesses dois campos, projetos de leis novos que podem tanto impedir seu setor de funcionar quanto alavancar”.

Segundo ela, o primeiro ponto consiste em fazer um mapeamento de stakeholders e conhecer seus aliados e seus detratores. Depois, é preciso elaborar estratégias propositivas. “Você deve pensar fora da caixa e entender que muitas vezes está diante de uma negociação, então você precisa levar uma proposta. Se um projeto de lei pode prejudicar seu setor, uma boa alternativa é oferecer algo melhor e chegar a um acordo”.

Um terceiro ponto importante, de acordo com Bárbara Teles, é a transparência com os stakeholders. É necessário mostrar ao poder público o funcionamento do seu setor e suas necessidades. “Temos que traduzir nosso cotidiano para o regulador. Assim, ele poderá entender melhor nossos pleitos”. Por fim, ser persistente. “Não podemos desistir. É essencial ser insistente, mas tendo empatia para se colocar no lugar do outro e ter moderação nos contatos. Mas funciona”.

Convidada: Rebecca Bonaldi

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Monitoramento constante e conhecimento local

Na reunião do GT Subnacionais do dia 14 de novembro, Rebecca Bonaldi, gerente de Public Affairs na Prospectiva Consultoria, apresentou estratégias de monitoramento e atuação nos governos subnacionais, abordando as dificuldades de transparência, a importância de entender as dinâmicas locais, e a necessidade de estabelecer relacionamentos sólidos com agentes do governo.

Bonaldi, que atua há oito anos com consultoria em estados e municípios, ressaltou a importância da transparência, mas que nem sempre é aplicada. “Sempre uso como exemplo a Alesp, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, a maior do país. Na prática, ela só vota projetos de lei em sessões extraordinárias, porque sempre há muitos vetos do Executivo. Se a Alesp acaba agindo desse jeito, imagina o que as outras podem fazer”, ponderou.

As plataformas de acompanhamento, que acenam com a facilitação do monitoramento da tramitação dos projetos de lei, nem sempre alcançam seus objetivos, pois muitas vezes os sistemas das casas legislativas estaduais e municipais não são atualizados com a frequência necessária. “Pouco adianta você ter uma plataforma que vai te mandar a atualização do sistema se as atualizações não são feitas no sistema. A solução é fazer um acompanhamento semanal, às vezes por telefone, em outras ocasiões indo até a casa, porque simplesmente não dá para confiar no sistema. Às vezes o Instagram da Assembleia é melhor do que o próprio sistema”.

Por mais que o monitoramento pareça algo básico, que hoje em dia pode ser robotizado, em muitos locais é necessária uma análise mais cuidadosa. “Precisamos ver onde e como as coisas funcionam, para podermos entender e só então construir uma inteligência. Quando a gente desce para os estados, principalmente para os municípios, a dinâmica partidária é completamente outra. Então temos que considerar também esse desafio, entender o cenário local, onde às vezes importa mais a família ou o grupo político do que a orientação do partido na Câmara dos Deputados”.

Convidado: Luigi Tedeschi

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Participar da construção do futuro


Debater a participação de atores sociais na formulação das políticas públicas,   foi a temática do encontro de 5 de dezembro de 2023, com foi Luigi Tedeschi, pós-graduado em Ciência Política e com MBA em Relações Governamentais e coordenador de Assuntos Governamentais da Toyota do Brasil.

Raquel Rocha, coordenadora do GT, explicou que a ideia da série de encontros do grupo é discutir desafios e algumas questões específicas, mais voltadas para estratégias e gestão do dia a dia, desde como fazer mapeamento a gestão de agenda. “Coisas que debatemos com frequência na atuação no âmbito federal, mas que acabamos deixando um pouco de lado quando tratamos com a esfera subnacional. Queremos produzir não apenas material sobre boas práticas, mas também sobre os grandes temas que afetam esse campo”.

Tedeschi ressaltou que seu foco seria analisar como funciona a participação das empresas na formulação das políticas públicas e, principalmente, como essa capacidade é utilizada em uma estratégia de relações governamentais de uma organização. Considerando que políticas públicas podem ser definidas, e que a atuação das empresas possui impactos na sociedade, estas são vistas como atores relevantes no debate dos problemas públicos. “Três aspectos são essenciais nesse processo. Legitimidade, ou seja, garantir a participação dos grupos que integram a sociedade, transparência e que reflita a realidade dos grupos sociais”. 

Para o coordenador de Assuntos Governamentais da Toyota do Brasil, as pessoas têm uma expectativa cada vez maior de que o setor privado se engaje, de fato, na resolução de problemas públicos. E isso acaba tendo reflexos não só na imagem, mas na atuação da empresa. “Um decisor pode priorizar receber uma empresa que atua nessa frente e detrimento de outra que não. E é possível usar aquela ação social, aquela participação social que a empresa tem justamente para me aproximar do governo para trazer novas agendas que são de interesse da minha empresa. Ou seja, isso acaba sendo uma plataforma para que eu possa defender meus interesses e, por fim, um instrumento de pressão. As empresas que não integrarem o processo de participação social perderão relevância frente à sociedade”.

Raquel Rocha pontuou que muitas vezes as empresas não têm tempo de fazer uma análise estratégica e acabam sendo muito reativas e pouco propositivas. “Nem as consultorias. Dificilmente você vê um projeto de consultoria contratada que é de fato um mapeamento do ambiente ou identificar oportunidades. Acho que a gente ainda vê essas estratégias de uma forma muito pontual e não consegue amarrar com um modelo de negócio”.

Tedeschi concorda que é importante que elas estejam de fato amarradas com o modelo de negócio, caso contrário as chances de acerto são pequenas. “Tem que estar conectado   com a estratégia. A gente não pode simplesmente fazer um projeto porque ele é legal e vai reverter em termos de imagem e reputação. É preciso ser ligado ao negócio da empresa, para que na hora da área de relações governamentais abordar o poder público seja realmente um diferencial”.

Para Raquel Rocha, isso se aplica especialmente às esferas subnacionais: “O   prefeito quer alguém da empresa presente à inauguração de uma nova escola. Esse é o ponto onde você consegue otimizar sua estratégia para vincular com essa demanda ou vontade do poder público local. Porque um erro comum na agenda do subnacional é se restringir ao âmbito social – você até pode ir aos eventos, mas se não apresenta nada de concreto para o prefeito, vai ficando no fim da fila. Em um município pequeno, no qual basta uma canetada do prefeito para resolver um problema que a empresa venha a ter, isso é essencial”.